sábado, 31 de julho de 2010

LUGHNASADAH


LUGHNASADH é o primeiro festival das colheitas. A Deusa é honrada sob o aspecto da Mãe que deu à luz a abundância e a prosperidade. É a época da primeira colheita na Roda do Ano. Este festival é simultaneamente céltico e saxónico, com aspectos e rituais diferentes, conforme as tradições do povo que o celebrava. O festival dos celtas era uma festa do fogo, honrando o deus solar Lugh (Lleu no País de Gales, Lugus na Gália), que favorece as colheitas.

Na Irlanda faziam-se jogos e corridas em seu nome e no da sua mãe, Tailtiu. Neste festival também eram realizados os casamentos informais que só duravam um ano e um dia, para o casal ter tempo de decidir se queria continuar unido ou separar-se, costume que durou até ao século XVI. Para os saxões, o festival tinha o nome de LAMMAS, a festa do Pão, na qual as primícias da colheita do cereal eram consumidas em rituais.

A data astrológica de LAMMAS situa-se nos quinze graus de Leão, que costuma acontecer por volta do dia 5 de Agosto. É o ponto de poder do Zodíaco simbolizado pelo Leão, outra das figuras tetramórficas do tarot que aparece nas cartas X - A Roda da Fortuna e XXI - O Mundo. Tradicionalmente, LAMMAS celebra-se na noite de 31 de Julho para 1 de Agosto.

Para a Igreja Católica também era a festa das primícias, em que os primeiros grãos de cereal eram colocados nos altares.

LAMMAS era a época do ano em que se faziam festivais de magia, onde os grupos armavam bancas de venda muito enfeitadas e se apresentavam em paradas, com danças e representações de teatro.

Estes festivais começaram por ser misturados com as festas de Santa Catarina, mas a Igreja Católica acabou por mudar o dia da santa diversas vezes, tentando mesmo acabar com o seu culto, tanto por ser uma figura mais mítica do que histórica, como por estar identificada com o movimento herético dos Cátaros. De qualquer forma, continuaram a festejar neste dia a "roda de Catarina", fazendo subir uma grande roda coberta com alcatrão por uma encosta acima, para lhe pegar fogo e a deixar rolar pela encosta abaixo. Neste costume parece haver resquícios de um ritual pagão que simbolizava o fim do Verão, com a roda em chamas em representação do Deus Sol no seu declínio.

Esta data tem ainda os nomes de Elembiuos e Dia das Maçãs, por ser a época do ano em que começa a apanha das maçãs, assim como de outros frutos e vegetais.

As suas cores são o verde, o amarelo, o castanho, o laranja e o dourado. Os símbolos são as alfaias agrícolas, o pão, todos os cereais e as cornucópias (que deitam malte, frutos e vegetais). É um dia em que se mistura a alegria da colheita com a apreensão pelos dias que se tornam cada vez mais pequenos.

As deidades para este Sabbat são os deuses das colheitas e dos cereais e as deusas parturientes.


Claire Grundell - Helix Tree


Referência bibliográfica:

BAPTISTA, Garcia, Wicca A Velha Religião do Ocidente, Pergaminho

La Belle Dame Sans Merci - John Keats

John William Waterhouse, La Belle Dame Sans Merci, 1893


Ballad


I.

O what can ail thee, knight-at-arms,
Alone and palely loitering?
The sedge has wither’d from the lake,
And no birds sing.

II.

O what can ail thee, knight-at-arms!
So haggard and so woe-begone?
The squirrel’s granary is full,
And the harvest’s done.

III.

I see a lily on thy brow
With anguish moist and fever dew,
And on thy cheeks a fading rose
Fast withereth too.

IV.

I met a lady in the meads,
Full beautiful—a faery’s child,
Her hair was long, her foot was light,
And her eyes were wild.

V.

I made a garland for her head,
And bracelets too, and fragrant zone;
She look’d at me as she did love,
And made sweet moan.

VI.

I set her on my pacing steed,
And nothing else saw all day long,
For sidelong would she bend, and sing
A faery’s song.

VII.

She found me roots of relish sweet,
And honey wild, and manna dew,
And sure in language strange she said—
“I love thee true.”

VIII.

She took me to her elfin grot,
And there she wept, and sigh’d fill sore,
And there I shut her wild wild eyes
With kisses four.

IX.

And there she lulled me asleep,
And there I dream’d—Ah! woe betide!
The latest dream I ever dream’d
On the cold hill’s side.

X.

I saw pale kings and princes too,
Pale warriors, death-pale were they all;
They cried—“La Belle Dame sans Merci
Hath thee in thrall!”

XI.

I saw their starved lips in the gloam,
With horrid warning gaped wide,
And I awoke and found me here,
On the cold hill’s side.

XII.

And this is why I sojourn here,
Alone and palely loitering,
Though the sedge is wither’d from the lake,
And no birds sing.


John Keats (1795-1821)

Travessia para Avalon: A Floresta da Mente


Nos sonhos e na literatura, é frequente os acontecimentos darem-se em paisagens que servem como metáforas para o terreno emocional e espiritual.

Depois de sair do Castelo do Graal, Perceval encontrou-se perdido na floresta. Lá conheceu muitas pessoas e situações que o confundiram. Encontrou uma donzela chorosa lamentando um guerreiro que fora decapitado, uma donzela maltratada num cavalo velho e desgraçado, uma rapariga asquerosa, horrível de se observar, um eremita numa capela, um cavaleiro negro num túmulo, um cavaleiro morto estendido num altar, uma misteriosa mulher envergando uma túnica vermelha salpicada de estrelas, uma criança numa árvore de luzes. Deparou com animais e entre eles: um perigoso veado branco, um cavalo preto e branco, um cavalo totalmente branco e um cão branco com uma trela de ouro. Foi desafiado para um jogo de xadrez, resolveu caçar o veado, libertou o cavaleiro do túmulo. Como nos sonhos, algumas figuras eram auxiliadoras, outras hostis ou neutras para consigo, e todas as personagens e situações podiam ser interpretadas simbolicamente.

As pessoas no meio de um período de floresta talvez descubram que deparam com projecções ou acontecimentos sincronísticos: o que podemos achar adorável ou asqueroso nos outros corresponde provavelmente a características ou atitudes que são do nosso foro. Da mesma forma, talvez sejamos nós aquela rapariga repelente, o cavaleiro decapitado, ou a chorosa donzela aos olhos de qualquer outra pessoa - ou até aos nossos.


Elizabeth Stanhope Forbes

Damos connosco "na floresta", quando perdemos os habituais pontos de referência: quando deparamos connosco a pôr em causa o significado do que estamos a fazer, ou das pessoas com quem nos achamos, ou temos sérias dúvidas acerca do caminho que andávamos a seguir ou da direcção que tomámos na última encruzilhada.

A floresta, o labirinto, o "mundo-além", o mundo inferior, o mar e as profundezas marinhas são todos descrições poéticas e simbólicas da forma como  percepcionamos o inconsciente como reino. É onde estamos quando estamos perdidos, e é onde precisamos de ir para nos encontrarmos. A individuação, a necessidade de vivermos partindo das nossas próprias profundezas de uma maneira autêntica e que nos faça crescer, é uma jornada que leva o ego para a floresta.

A floresta é um lugar metafórico de perigo e transformação. Não há estradas claramente assinaladas. Se tivermos medo, as sombras podem ser sinistras; se somos temerários, a floresta pode ser um local perigoso.

Por vezes, sem intenção, somos nós que entramos na floresta. Atraídos por alguém ou alguma coisa, deixamos o  terreno familiar mudando ou abandonando relações, trabalho, família, comunidade, ou sistema de crenças. Por vezes, deparamo-nos na floresta porque alguém nos deixa, ou perdemos o emprego, ou porque um diagnóstico médico, ou um acidente, altera tudo.

Também há alturas em que nos achamos na floresta depois de encerrarmos intencionalmente uma certa fase da vida: saímos por uma porta e batemos com ela, o que nos leva aí. Não chega compreendermos que devemos partir - deixar uma relação destrutiva, um emprego, um ambiente - : temos de ser capazes de agir sobre esse conhecimento. Como no mito de Psique, temos de ter tanto a candeia (um símbolo de iluminação ou da consciência que nos permite ver a situação com clareza) como a faca (a capacidade de actuar decisivamente, de ser capaz de cortar laços).

A incapacidade de a vida continuar como de costume aparece-nos por uma quantidade de razões. Não é o acontecimento em si que a provoca, mas, em consequência disso, os abismos a que descem as nossas almas.



Quando entramos numa fase de floresta, também entramos num período de itinerância e de potencial desenvolvimento da alma. Na floresta é possível ligarmo-nos de novo à nossa natureza inata, encontrar o que deixámos na sombra e o conhecimento, ou reconhecimento, de nós próprios a que voltámos a cara, ou ainda, o mundo pessoal e patriarcal que habitamos. Aí é possível descobrir de que é que temos andado afastados, "re-lembrar" um aspecto de nós mesmos outrora vital. Podemos achar um manancial de criatividade que esteve escondido durante décadas. Aí também poderemos ser atacados por críticas ou abandonados aos nossos piores receios. Principalmente, uma vez na floresta, temos de encontrar o que precisamos para sobreviver.

Perceval passou mais de cinco anos na floresta. Como qualquer outro processo labiríntico, leva o tempo que tiver de levar. Só depois de o conseguirmos compreender, percebemos até que ponto nos modificou, o que foi destruído e abandonado, e aquilo que nasceu de nós, que descobrimos ou recuperámos ali.

Esse tempo "no buraco" pode ser considerado, de facto, como um caldeirão de renascimento e recuperação, o caldeirão céltico que foi um precursor do Graal cristão, que continha dor e trevas assim como beleza e mistério, do qual se pode sair transformado de forma significativa.

Por muito assustador que seja encontrarmo-nos no meio da floresta, por muito tempo e por muito solitários que  nos possamos sentir, é um panorama psicológico vivo e cheio de potencial. Trata-se de um local muitíssimo melhor para a alma do que um ermo...

in Travessia para Avalon, de Jean Shinoda Bolen (texto adaptado e com supressões) 




sexta-feira, 30 de julho de 2010

Ride Si Sapis: The Black Knight

What are you going to do? Bleed on me?


Monty Python - The Holy Grail (The Black Knight)

A Floresta e as Terras Aventurosas

Muitas das aventuras da Távola Redonda tomam lugar na floresta densa e primitiva. Em parte isto reflecte a própria aparência da paisagem na época da escrita da maioria dos romances arturianos; mas há um significado mais profundo. A floresta simbolizava um mundo fora do domínio do Homem, onde qualquer coisa podia acontecer. Também representava um determinado estado de espírito - Dante refere a impenetrável floresta da mente, na qual a alma, despertando para a jornada da vida, se encontra perante uma infinidade de caminhos através da escuridão do mundo por baixo das árvores.


H. R. Rheam

A floresta era parte do Outro Mundo. Algumas tinham nomes: Broceliande, Arden, Inglewood. Lugares sombrios, repletos de encantamentos, onde só os mais intrépidos se aventuravam.

No entanto, além de terrores, a floresta também podia desvendar maravilhas. Das suas profundezas surgiam belíssimas fadas que punham à prova os cavaleiros errantes que procuravam o seu caminho por entre as árvores; muitas delas buscavam maridos entre os Cavaleiros da Távola Redonda, deles concebendo filhos  e assim disseminando "sangue feérico" na Confraria.  

No Lais de Maria de França (séc. XII), conta-se que um desses cavaleiros, Sir Launfal, apaixonado por uma linda fada, jurou segredo da sua existência sob pena de perder o seu amor para sempre. Quando Guinevere o tentou seduzir, Launfal não conseguiu manter o silêncio e, em desespero, declarou que nem ela, em toda a sua beleza, chegava aos pés da sua amada. Ganhando assim a inimizade da rainha, o cavaleiro é condenado à morte por recusar-se a revelar mais do seu segredo. É então que a fada aparece na corte, deslumbrando todos com a sua beleza, e leva-o com ela, para Avalon, acredita-se...

The Loathly Lady, Ilustração de Darrell Sweet

Nem todas mulheres da floresta eram assim belas... Ragnall, "The Loathly Lady", persuadiu o rei Artur a conceder-lhe a mão de seu sobrinho, Gawain, em troca da sua ajuda na resolução do enigma colocado por Gromer, irmão da feia anciã. À sua chegada à corte, todos ficam repugnados com a sua extrema fealdade, mas Gawain mantém a promessa feita. Quando Gromer chega e pergunta mais uma vez: O que é que as mulheres mais desejam ? Artur responde: As mulheres desejam ter soberania sobre os homens. Ragnall e Gawain casam e, ao primeiro beijo, ela transforma-se e revela a sua verdadeira beleza graças ao amor e compreensão de Gawain. Contudo, é colocado ao cavaleiro o dilema de decidir se Ragnall deve permanecer bela de dia e feia à noite, ou o inverso. Compreendendo verdadeiramente o sentido da pergunta, Gawain implora-lhe que seja ela a decidir e assim o encanto desfaz-se permanentemente.

Também nas profundezas da floresta, habitava a Questing Beast, uma criatura parte leão, parte serpente, parte cabra, que emitia um som como se trinta pares de mastins estivessem no seu ventre. Artur avista pela primeira vez a Besta quando rapaz, antes de ser coroado rei, constituindo tal presságio de um encontro com Merlim. Este aparece primeiro como uma criança, depois como um ancião que revela ao rapaz a sua verdadeira linhagem bem como uma série de enigmáticas profecias acerca do seu futuro. A Questing Beast existe meramente para ser procurada e foi perseguida muitos anos pelo rei Pellinore (pai de Perceval). Depois da sua morte, a demanda é retomada pelo cavaleiro Palomides que jamais conseguirá capturar a criatura do Outro Mundo.

                                                                                                                                          

É frequente nas lendas arturianas, a presença de homens e mulheres com o poder de se transformarem em animais. Numa dessas histórias, Artur segue uma estranha criatura que depois se torna num venerável ancião; noutra, uma das mais antigas histórias de lobisomens, um cavaleiro é amaldiçoado e só consegue tornar à sua forma humana, depois de muitos anos a viver como um lobo. Na lenda galesa da Dama da Fonte, podemos encontrar o Senhor das Bestas, com um pé, um olho e um braço, dominando todas as criaturas da floresta. 

Outros cavaleiros ficam ligados a um animal específico: Owain a um leão, Gawain a um cavalo encantado que o transporta a terras misteriosas... São, por extensão, como totens do xamã, que funcionam como guias da alma nas suas jornadas ao Outro Mundo.

Na tradição arturiana, os animais surgem como guias, guardiões ou ainda adversários.

No poema galês Preiddeu Annwn, Artur lidera um grupo de extraordinários heróis que buscam um caldeirão miraculoso, aquecido pelo fôlego de nove donzelas. Tendo de passar por sete níveis - cada um guardado por uma fortaleza - Artur e os seus homens conseguem roubar o caldeirão e retornar ao mundo humano, não sem custos pois "só sete regressaram".

Das Terras Aventurosas até ao Vale Sem Regresso, os cavaleiros da Távola Redonda aventuram-se e lutam sem cessar. Como os pistoleiros do Velho Oeste, são desafiados por todos aqueles com o desejo de se afirmarem como os melhores e de ganharem também um lugar na famosa Távola.



A matança de monstros, gigantes e feras era frequentemente uma alegoria para a luta vitoriosa contra povos invasores.


 Muitos heróis provêm de duas importantes famílias: as casas de Orkney e de Galles. Gawain, Gaheris, Agravain e Gareth eram filhos do rei Lot de Orkney e de Morgause, meia-irmã de Artur e também mãe do bastardo Mordred. Da família Galles, Perceval, Lamorack e Aglovale eram os filhos do rei Pellinore, que também tinha vários filhos ilegítimos - incluindo Sir Tor ou Torre. Também tinha uma filha, por vezes nomeada Dindraine, que desempenhou um importante papel na Demanda do Graal.

Havia uma grande rivalidade entre estes dois clãs, despoletada pela morte de Lot às mãos de Pellinore. A facção de Orkney empreendeu vários ataques como vingança culminarando esta nas mortes de Morgause e Lamorack, que se tinham tornado amantes. Gaheris matou a sua própria mãe e os irmãos assassinaram Lamorack.

Apesar destas lutas internas, a Companhia da Távola Redonda não deixa de ser referida como a mais alta ordem da Cavalaria, sem precedentes nem rivais, com  Artur a desempenhar um papel similar ao do Papa, uma vez que é o Imperador, o chefe supremo de todos os cavaleiros.

No mundo arturiano, donzelas e dragões são frequentemente emparelhados como representações do sagrado e do profano respectivamente.

Tudo chega ao fim na terrível de batalha de Camlan, e nada é encontrado para substituir a Távola Redonda. Instala-se de novo a anarquia. As Terras Aventurosas dissipam-se nas memórias e a ligação à floresta do Outro Mundo é cortada, mas o sonho permanece até  hoje...

Artur confronta uma serpente de sete cabeças. As histórias e lendas sobre chacinas de monstros representam também a vitória do herói sobre os seus medos, os seus monstros interiores.

Referência bibliográfica:

MATHEWS, Arthur, The Arthurian Tradition, Element Books Limited, 1994

terça-feira, 27 de julho de 2010

Ride Si Sapis - "Lady of Shalott"


Anne of Green Gables, 1985

A Távola Redonda

A Table in the Likeness of the World



Apesar dos avisos de Merlim, Artur escolhe Guinevere, a filha do rei Leodegrance, para sua rainha. Com ela, vem a grande Távola Redonda, como dote, feita por Merlim a pedido de Uther Pendragon, pai de Artur. Cento e cinquenta cavaleiros podem nela sentar-se, sem nenhum parecer favorecido.

No dia do casamento de Artur, cem cavaleiros se sentaram na Távola Redonda. Nas costas de cada cadeira, estava um nome gravado em letras de ouro. Os nomes eram dos cem já escolhidos e de muitos que ainda estavam por vir, mas um lugar permanece em branco. Questionado, Merlim, enigmaticamente, respondeu que, no seu devido tempo, será preenchido...

Assim a Confraria dos Cavaleiros da Távola Redonda se reuniu pela primeira vez, no dia do casamento de Artur e Guinevere; e se as sementes já estavam lançadas para a ruína do grande sonho de Artur, as sombras ainda estavam distantes naquele dia. Começou então o grande ideal cavalheiresco, cuja fama iria inspirar reis de muitos países e épocas a fundarem Ordens à semelhança da Távola Redonda.


John H. Bacon, Casamento de Artur e Guinevere

Aventuras e desafios aos cavaleiros surgem logo desde o primeiro dia. Um padrão instala-se: uma dama em apuros ou um cavaleiro chegam à corte implorando auxílio a Artur e à Confraria. Desde que o pedido seja justo e a demanda honesta, a Távola Redonda não pode recusar pois está sob o seguinte juramento:

Never to do outrage nor murder, and always to flee
treason; also, by no means to be cruel, but to give
mercy unto him that asketh mercy, upon pain of
forfeiture of their worship and lordship of King Arthur
for evermore; and always to do ladies, damosels,
and gentlewomen succour, upon pain of death.
Also, that no man takes no battles in a wrongful
quarrell for no law, nor for world's goods.
Unto this were all the knights sworn of the table
Round, both old and young. And every year were
they sworn at the high feast of pentecost.

As regras são simples e assentam em ideais da cavalaria medieval. Sendo humanos, nem todos os cavaleiros cumprem rigorosamente estas exigências. No entanto, apesar de algumas falhas, não deixam de respeitar o código de honra da Távola Redonda sempre que são chamados a responder a estranhos acontecimentos e desafios.

Artur estabelece o costume de, em cada banquete, não começar a comer enquanto não ouvir alguma história ou relato de aventura que suscite encanto e maravilhamento. E assim se instala um padrão, onde os cavaleiros partem à descoberta de aventuras, de injustiças para reparar, de vilões para combater. Erram pelas florestas do reino de Artur em busca de um ideal de cavalaria e do reino terrestre perfeito.


A Távola Redonda de Artur servia muitas funções: prevenia as disputas sobre a precedência, simbolizava a completude e representava a Mesa da Última Ceia, com o Graal ao centro. (O Rei Artur e os Cavaleiros da Távola Redonda Incitados à Demanda por uma Estranha Donzela, de E. Burne-Jones, Tapeçaria, 1898-99)


Referências bibliográficas:

MATHEWS, John, The Arthurian Tradition, Element Books, Limited, 1994
COTTERELL, Arthur, Enciclopédia de Mitologia, Central Livros LDA, 1998

Para um estudo mais detalhado ver aqui

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Travessia para Avalon

Na lenda de Glastonbury, o Poço do Cálice e o Poço Sagrado de Avalon são considerados uma só e a mesma coisa. O poço é uma nascente situada entre o Tor de Glastonbury e o Monte do Cálice. Ergue-se dentro de um poço, em pedra, com quase três metros de profundidade e corre abundantemente, dando cerca de vinte e cinco galões por dia. A água contém ferro e, embora pareça cristal límpido, o curso de água raso e os poços onde aflui estão manchados de vermelho, devido a esse mesmo ferro. Dantes, chamavam-lhe Fonte do Sangue ou Poço do Sangue.

Mais uma vez, o nome Poço do Cálice e a água tingida de ferro sugerem um vaso sagrado cheio de sangue, desta vez brotando da Terra-Mãe no local que "era Avalon". (...)

Poços sagrados alimentados por fontes no subsolo encontraram-se, muitas vezes, em locais da deusa. O poço pode ter sido ignorado mais tarde, desde que o sítio se tornou cristão - como na Catedral de Chartres, onde o poço está numa cripta, com a tampa aferrolhada. Ou um poço outrora consagrado à Deusa pode ter passado a ter outro nome, depois de consagrado de novo a uma santa: na Irlanda, esses poços tornaram-se "poços da Brígida", por causa de Santa Brígida. Na mitologia e lendas, Deusa e poço encontram-se juntos com frequência. Na mitologia nórdica, como no ciclo operático de Richard Wagner de O Anel dos Nibelungos, por exemplo, a Deusa (Erda) era uma fonte de sabedoria, e beber da nascente era um meio de "mergulhar" nessa fonte.

O jardim do Poço do Cálice tem um muro em volta e entra-se nele por um portão. No entanto, mesmo quando não está aberto aos visitantes, um fluxo contínuo de água sai por um desaguadouro para o lado da rua, onde as pessoas podem encher as vasilhas e beber, a qualquer hora.

Dion Fortune escreveu sobre o Poço do Cálice, em Avalon of the Heart, dizendo que há uma grande câmara que se abre na parede do poço, ou um recesso suficientemente grande para uma pessoa estar aí de pé, ou o Graal ser escondido, e que no solstício de Verão um raio de luz brilha direito a essa câmara interior. A câmara é feita de grandes blocos de pedra, como os usados em Stonehenge, pedra essa que se não consegue encontrar nas proximidades. O trabalho de pedreiro é perfeitamente verosímil e exacto, para ali trazido e construído por meios que não conseguimos imaginar. (...)

(...) Há muitas coisas relativas a Glastonbury que têm ar de não pertencerem a este Mundo.

VESICA PISCIS

Em latim, vesica piscis significa "vaso do peixe". O desenho básico provém da sobreposição das bordas de dois círculos de igual tamanho, passando a circunferência de cada um pelo meio do outro, e criando assim uma forma em amêndoa ou oval pontiagudo entre ambos.

Quando os dois círculos estão um sobre o outro, a forma intercalar torna-se no contorno do corpo de um peixe, que é símbolo de Cristo, um símbolo fácil de desenhar, que os primeiros cristãos usavam para se identificar pessoalmente uns aos outros. Diz-se que a razão do uso de um peixe como símbolo cristão era a palavra grega para peixe, ichthys, poder ser um acrónimo para Jesus Cristo, Filho de Deus.


Todavia, antes de se tornar um símbolo cristão, a vesica piscis era um símbolo universal da Deusa-Mãe, representando a mandorla, em forma de amêndoa, um contorno da sua vulva, donde brotava toda a vida. Para ser um símbolo da Deusa, os círculos sobrepunham-se lado a lado, e a forma amendoada tinha as pontas bicudas para cima e para baixo.


Quanto ao nome vesica piscis, diz-se que a vulva tem um ligeiro cheiro a peixe: na Grécia, a palavra delphos significa tanto útero como peixe, e há muitas associações culturais cruzadas entre deusa e peixe. As imagens da porta do templo à deusa hindu Kali e a figura feminina Sheela-na-gig, que estava gravada ou esculpida no arco de entrada das antigas igrejas irlandesas, exibem as vulvas como vesicas. E também há muitos medalhões católicos com essa forma.

A vesica piscis na tampa do Poço do Cálice incorpora os círculos sobrepostos, mas tem um desenho mais complicado. Os dois círculos estão contidos num círculo maior, ou rodela. Em ambos os lados dessa básica vesica piscis há desenhos de videira e folhas, e, no meio, existe uma vareta vertical, que parece brotar da vida da planta, na base, ou mergulhar nesta. (...)

Passei a pensar na vesica piscis, a imagem de dois círculos que se sobrepõem, como uma metáfora visual daqueles momentos em que os mundos se sobrepõem ou interpenetram, e a vida está imbuída de profundidade e significado. Para mim, essas são "experiências da vesica piscis": intersecções da intemporalidade com o tempo. Momentos que ocorrem no tempo e fora do tempo, quando o mundo visível e o invisível se interseptam; quando o mundo arquetípico e o mundo tangível se encontram; quando o Céu e a Terra, o mundo superior e o inferior, se tocam num instante liminar.
   
Neste caso, é inteiramente adequado que esta imagem esteja ligada a Glastonbury, onde se pode atravessar as brumas de Avalon e beber no poço sagrado, na imaginação literária e na lenda.


in Travessia para Avalon, de Jean Shinoda Bolen, Planeta Editora

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Elaine de Astolat

"But to be with you
still and see your face, to serve you
and to follow you thr'o the world."

 
John Grimshaw, The Lady of Shalott

Elaine of Astolat ou Ascolat é uma figura feminina no ciclo arturiano que morre tragicamente de amor não correspondido por Lancelot. Diferentes versões da sua história surgem em Le Morte D’Arthur , de Thomas Malory, e Idylls of the King, de Alfred Tennyson. Elaine de Astolat também serve de inspiração ao poema The Lady of Shalott, de Tennyson.

No início do século XIII, uma versão da história já tinha surgido em Mort Artu, em que uma Demoiselle d’Escalot morre de amor por Lancelot sendo levada pela corrente do rio num barco até Camelot. Ainda no século XIII, outra versão é apresentada numa novela italiana – La Donna di Scallota, que serviu de fonte ao poema de Tennyson.

Em Le Morte d'Arthur, de Thomas Malory (século XV), a história de Elaine começa quando Lancelot participa numa justa organizada pelo pai da donzela, Bernard de Astolat, para Artur e os cavaleiros da Távola Redonda.

E. Frampton, Elaine

Elaine enamora-se de Lancelot e pede-lhe que use uma lembrança sua no torneio (como era costume). Lancelot aceita pois como vai combater disfarçado, o símbolo ajudá-lo-á a manter a ilusão de que é outro cavaleiro. Deixa portanto o seu escudo, que o denunciaria, com Elaine e usa antes o de Torre, irmão da donzela.


Lancelot vence o torneio mas é ferido pela lança de Bors. Elaine fica à sua cabeceira cuidando dele desveladamente. Após a sua recuperação, Lancelot pretende pagar à donzela pelos seus serviços e esta, sentindo-se insultada, entrega-lhe o seu escudo. Lancelot parte para nunca mais regressar, conhecendo agora os sentimentos de Elaine para com ele.

Algum tempo depois, Elaine morre de desgosto. De acordo com instruções que deixou, o seu corpo é depositado numa barca, com um lírio numa mão e a sua carta final na outra. O barco desce o rio até Camelot onde é avistado pela corte do rei Artur. Lancelot é convocado, ouve o conteúdo da carta e lamenta a morte da Lily Maid.

Henry Wallis, Lady of Shalott

Lady of Shalott , Alfred Lord Tennyson

Lady of Shalott é uma donzela amaldiçoada que precisa constantemente de tecer uma tapeçaria mágica sem poder olhar directamente para fora, para o mundo. Em vez disso, ela vê através de um espelho que reflecte a movimentada estrada vinda de Camelot. Quando pára de tecer para olhar directamente, pela janela, para Lancelot, a maldição cai sobre si...


William Waterhouse, The Lady of Shalott Looking At Lancelot


The Lady of Shalott, by Alfred Lord Tennyson

On either side the river lie
Long fields of barley and of rye,
That clothe the wold and meet the sky;
And thro' the field the road runs by
To many-tower'd Camelot;
And up and down the people go,
Gazing where the lilies blow
Round an island there below,
The island of Shalott.

Willows whiten, aspens quiver,
Little breezes dusk and shiver
Through the wave that runs for ever
By the island in the river
Flowing down to Camelot.
Four grey walls, and four grey towers,
Overlook a space of flowers,
And the silent isle imbowers
The Lady of Shalott.

By the margin, willow veil'd,
Slide the heavy barges trail'd
By slow horses; and unhail'd
The shallop flitteth silken-sail'd
Skimming down to Camelot:
But who hath seen her wave her hand?
Or at the casement seen her stand?
Or is she known in all the land,
The Lady of Shalott?

Only reapers, reaping early,
In among the bearded barley
Hear a song that echoes cheerly
From the river winding clearly;
Down to tower'd Camelot;
And by the moon the reaper weary,
Piling sheaves in uplands airy,
Listening, whispers, " 'Tis the fairy
Lady of Shalott."

There she weaves by night and day
A magic web with colours gay.
She has heard a whisper say,
A curse is on her if she stay
To look down to Camelot.
She knows not what the curse may be,
And so she weaveth steadily,
And little other care hath she,
The Lady of Shalott.

And moving through a mirror clear
That hangs before her all the year,
Shadows of the world appear.
There she sees the highway near
Winding down to Camelot;
There the river eddy whirls,
And there the surly village churls,
And the red cloaks of market girls
Pass onward from Shalott.

Sometimes a troop of damsels glad,
An abbot on an ambling pad,
Sometimes a curly shepherd lad,
Or long-hair'd page in crimson clad
Goes by to tower'd Camelot;
And sometimes through the mirror blue
The knights come riding two and two.
She hath no loyal Knight and true,
The Lady of Shalott.

But in her web she still delights
To weave the mirror's magic sights,
For often through the silent nights
A funeral, with plumes and lights
And music, went to Camelot;
Or when the Moon was overhead,
Came two young lovers lately wed.
"I am half sick of shadows," said
The Lady of Shalott.

A bow-shot from her bower-eaves,
He rode between the barley sheaves,
The sun came dazzling thro' the leaves,
And flamed upon the brazen greaves
Of bold Sir Lancelot.
A red-cross knight for ever kneel'd
To a lady in his shield,
That sparkled on the yellow field,
Beside remote Shalott.

The gemmy bridle glitter'd free,
Like to some branch of stars we see
Hung in the golden Galaxy.
The bridle bells rang merrily
As he rode down to Camelot:
And from his blazon'd baldric slung
A mighty silver bugle hung,
And as he rode his armor rung
Beside remote Shalott.

All in the blue unclouded weather
Thick-jewell'd shone the saddle-leather,
The helmet and the helmet-feather
Burn'd like one burning flame together,
As he rode down to Camelot.
As often thro' the purple night,
Below the starry clusters bright,
Some bearded meteor, burning bright,
Moves over still Shalott.

His broad clear brow in sunlight glow'd;
On burnish'd hooves his war-horse trode;
From underneath his helmet flow'd
His coal-black curls as on he rode,
As he rode down to Camelot.
From the bank and from the river
He flashed into the crystal mirror,
"Tirra lirra," by the river
Sang Sir Lancelot.

She left the web, she left the loom,
She made three paces through the room,
She saw the water-lily bloom,
She saw the helmet and the plume,
She look'd down to Camelot.
Out flew the web and floated wide;
The mirror crack'd from side to side;
"The curse is come upon me," cried
The Lady of Shalott.

In the stormy east-wind straining,
The pale yellow woods were waning,
The broad stream in his banks complaining.
Heavily the low sky raining
Over tower'd Camelot;
Down she came and found a boat
Beneath a willow left afloat,
And around about the prow she wrote
The Lady of Shalott.

And down the river's dim expanse
Like some bold seer in a trance,
Seeing all his own mischance --
With a glassy countenance
Did she look to Camelot.
And at the closing of the day
She loosed the chain, and down she lay;
The broad stream bore her far away,
The Lady of Shalott.

Lying, robed in snowy white
That loosely flew to left and right --
The leaves upon her falling light --
Thro' the noises of the night,
She floated down to Camelot:
And as the boat-head wound along
The willowy hills and fields among,
They heard her singing her last song,
The Lady of Shalott.

Heard a carol, mournful, holy,
Chanted loudly, chanted lowly,
Till her blood was frozen slowly,
And her eyes were darkened wholly,
Turn'd to tower'd Camelot.
For ere she reach'd upon the tide
The first house by the water-side,
Singing in her song she died,
The Lady of Shalott.

Under tower and balcony,
By garden-wall and gallery,
A gleaming shape she floated by,
Dead-pale between the houses high,
Silent into Camelot.
Out upon the wharfs they came,
Knight and Burgher, Lord and Dame,
And around the prow they read her name,
The Lady of Shalott.

Who is this? And what is here?
And in the lighted palace near
Died the sound of royal cheer;
And they crossed themselves for fear,
All the Knights at Camelot;
But Lancelot mused a little space
He said, "She has a lovely face;
God in his mercy lend her grace,
The Lady of Shalott.


William Waterhouse, The Lady of Shalott

The Lady of Shalott


Enya - Isobella

Lady of Shalott - Yo m'enamori d'un aire


William Maw Egley, Lady of Shalott


YO M' ENAMORI D' UN AIRE

(Anònim Sefardi)

Yo m'enamori d'un aire,
d'un aire d'un donzell,
d'un donzell molt formós,
bell del meu cor.

Yo m'enamori de nit,
la lluna m' enganyà.
Si hagués estat de dia,
yo no hauria conegut l'amor.

Si altre cop yo m'enamoro,
que sigui de dia, amb sol.



Arianna Savall - Yo m'enamori d'un aire

terça-feira, 20 de julho de 2010

Elaine de Corbenek

Dante Gabriel Rossetti, The Grail Maiden, 1874

Elaine de Corbenek (também conhecida como Amite, Helaine, Heliaebel , Helizabel ou Perevida) é identificada como a “Donzela do Graal”. É referida pela primeira vez no Ciclo da Vulgata mas só em Le Morte D’Arthur, de Thomas Malory, emerge como uma personagem determinante na lenda do Graal. Filha do rei Pelles, a sua primeira acção significativa é mostrar o Santo Cálice a Lancelot. E é com o cavaleiro que concebe Galahad.

O rei Pelles profetiza que da união de Lancelot e Elaine nascerá Galahad, “ o mais nobre cavaleiro do mundo”, e que este conseguirá alcançar o Santo Graal.

De acordo com Malory, Lancelot salva Elaine de um banho encantado de águas ferventes e a donzela apaixona-se por ele. Como sabe que o cavaleiro só tem olhos para Guinevere, pede ajuda à sua aia, Dame Brusen, para o seduzir. Dame Brusen, por artes mágicas, consegue iludir Lancelot e fazê-lo pensar que está com Guinevere, quando de facto está com Elaine.

Na manhã seguinte, quando Lancelot descobre que dormiu com outra mulher que não Guinevere, desembainha a sua espada e ameaça matar Elaine. Esta diz-lhe que terá um filho dele e Lancelot beija-a e parte. O tempo passa e Elaine dá à luz Galahad.

Já em Camelot, Elaine sofre ao ser ignorada por Lancelot. Novamente recorre a Dame Brusen e esta, mais uma vez, consegue unir cavaleiro e donzela por uma noite. No entanto, são surpreendidos por Guinevere que, furiosa, afirma não querer vê-lo nunca mais... Lancelot, enlouquecido de desgosto, salta da janela e foge desesperado.

Elaine confronta corajosamente Guinevere acusando-a de crueldade desnecessária e abandona a corte. É ela que ajuda Lancelot a recuperar-se mostrando-lhe o Santo Graal que o cura. Lancelot parte com Elaine, vivendo com ela vários anos.

Elaine of Carbonek é frequentemente eclipsada por Elaine de Astolat ( inspiradora da famosa Lady of Shalott do poema de Tennyson). Ambas apaixonam-se por Lancelot mas só a de Carbonek consegue seduzir, ainda que por meios duvidosos, o cavaleiro. Apesar disto, é desconsiderada pela maioria dos analistas literários, ao contrário da de Astolat. Uma hipótese para este facto, é a ambiguidade moral das suas acções. Ela não se enquadra numa categoria definida das personagens femininas do ciclo arturiano pois não é boa nem má. Mas é, para todos os efeitos, a Donzela, a Guardiã do Graal que sacrifica a sua virgindade e pureza para conceber com o melhor cavaleiro do reino, o futuro herói do Graal.

 
Ilustração de Arthur Rackman, 1917

domingo, 18 de julho de 2010

Lancelot du Lac, de Robert Bresson

Lancelot du Lac é um filme de 1974 escrito e realizado por Robert Bresson. Relata a história de amor entre Lancelot e Guinevere e a queda de Camelot e da Távola Redonda.

O elenco é composto por actores amadores que são dirigidos por Bresson no sentido de uma intencional falta de emoção na representação, com a eliminação dos elementos fantásticos da tradição arturiana.

O filme ganhou o prémio FIPRESCI no festival de Cannes de 1974.

sábado, 17 de julho de 2010

Lancelot

Blow, weary wind,
The golden rod scarce chiding;
Sir Launcelot is riding
By shady wood-paths pleasant
To fields of yellow corn.
He starts a whirring pheasant,
And clearly winds his horn.
The Queen's Tower gleams mid distant hills;
A thought like joyous sunshine thrills,
"My love grows kind."

Launcelot by Sinclair Lewis

As origens literárias de Lancelot são vagas. Presume-se que derive de um herói chamado Llwch Lleminiawg, que aparece no Mabinogion e no poema galês Preiddeu Annwn. Além destas referências escassas, nada mais é conhecido dele até reaparecer num poema suíço do século XII intitulado Lanzalet, embora aqui ainda não assumisse o seu famoso papel como amante de Guinevere.

De acordo com Thomas Malory,em Le Morte D'Arthur, Lancelot era filho do rei Ban de Benwick e da sua rainha, Elaine. O rei Ban envolveu-se numa guerra com o rei vizinho Claudus e foi derrotado por este. Rei e rainha tiveram de fugir. Durante a fuga, Ban olhou para trás e ao avistar o seu castelo em chamas sucumbiu. Correndo em sua ajuda, Elaine deixou o filho, então com o nome de Galahad, junto a um lago. A Dama do Lago raptou a criança e criou-a nas suas águas mágicas.

A criança, agora com o nome de Lancelot du Lac, cresceu na companhia de mulheres e das fadas do palácio  da Dama do Lago. Depressa revelou grande aptidão para as armas. Aos dezoito anos, reuniu-se com os seus primos, Bors e Lional, e o seu meio-irmão, Ector, e, juntos, dirigiram-se para Camelot. Em memória do apoio prestado pelo rei Ban durante a sua juventude, Artur favoreceu Lancelot armando-o cavaleiro no dia de S.João.

Lancelot, o mais belo e dotado dos cavaleiros de Artur, atraía as rainhas mortais e imortais. Aqui vemos quatro rainhas das fadas raptando o cavaleiro adormecido para o levarem para o seu castelo, exigindo-lhe que escolhesse de entre elas qual seria a sua amante. (The Four Queens Find Lancelot Sleeping, de Frank Cowper, 1954)

Nalgumas versões da lenda, uma das primeiras missões de Lancelot foi escoltar a noiva de Artur, Guinevere, filha do rei Leodegraunce, a Camelot, para a cerimónia do casamento. Foi nesta ocasião que os dois se apaixonaram. Noutros textos, Guinevere já estava estabelecida como rainha quando Lancelot chegou à corte arturiana e depressa se tornou um dos cavaleiros da rainha, uma espécie de sub-ordem da Távola Redonda frequentada pelos jovens aspirantes a cavaleiros, antes de provarem plenamente o seu valor.

Lancelot iniciou então uma série de aventuras que o estabeleceram, sem margem para dúvidas, como o melhor cavaleiro do seu tempo. Entre outros feitos, conquistou um castelo chamado Dolorous Guard, que depois passou a ser a sua casa, mudando-lhe o nome para Joyous Guard. No cemitério assombrado deste castelo, Lancelot conseguiu descerrar a tampa de um túmulo que mais ninguém conseguia para nele encontrar escrito o seu verdadeiro nome e linhagem e uma profecia relativa ao seu futuro filho cujo nome também será Galahad.

Ao regressar a Camelot, Lancelot tornou-se um cavaleiro da Távola Redonda. Auxiliou Artur a acabar com a rebelião do Príncipe Galehaut, que se rendeu depois de reconhecer a honradez e a nobreza de carácter de Lancelot. Galehaut tornou.se depois um amigo chegado de Lancelot agindo até como intermediário entre o cavaleiro e a sua amada rainha.

No episódio da Falsa Guinevere, foi no castelo de Galehaut que Lancelot e a verdadeira rainha se refugiaram. Depois da descoberta e consequente morte da Falsa, Lancelot retornou com a rainha mas os dois  já estavam irremediavelmente apaixonados. A vida do cavaleiro tornou-se assim numa luta permanente com a sua própria consciência levando-o em demanda atrás de demanda no intuito de se afastar da corte e da rainha.

Guinevere e Lancelot beijam-se no seu primeiro encontro, proporcionado por Galehaut. (Iluminura, c.1400)

Numa dessas aventuras, Lancelot salvou uma donzela de um banho de águas ferventes, criadas por um encantamento. Ela era Elaine de Corbenic, filha do rei Pelles, o Guardião do Graal. Através da magia, Lancelot dormiu com Elaine, pensando estar com Guinevere, e foi assim que Galahad foi concebido. Foi sugerido por Pamela Lyndon Travers (escritora australiana, criadora de Mary Poppins) que Lancelot teria feito um voto de celibato por não poder amar livremente Guinevere. O reconhecimento de que não só tinha traído a sua amada como tinha quebrado o voto levou-o à loucura.

Acabou por ser descoberto por Elaine de Astolat a vaguear nu e faminto na floresta. A jovem ajudou-o a recuperar-se e apaixonou-se irremediavelmente por ele. Porém, o seu amor nunca foi correspondido e Elaine acabou por morrer de desgosto.

Lancelot e Elaine de Astolat - o cavaleiro aceitou ser o seu campeão em batalha e deu-lhe o seu escudo. A donzela apaixonou-se por ele mas Lancelot não lhe retribuiu a afeição e ela morreu de desgosto amoroso. (Lancelot e Elaine, de Eleanor Fortescue-Bricksdale)
Aquando da Demanda do Santo Graal, Lancelot e Galahad, pai e filho, estabeleceram uma intensa mas breve relação, pois Galahad morreu após encontrar o Cálice Sagrado. Lancelot também teve algumas visões do Graal e conseguiu chegar à Capela onde este estava guardado mas a sua entrada foi impedida por um anjo e o cavaleiro caiu num transe que durou várias semanas. 

Foi perfeitamente claro para Lancelot que o seu fracasso se deveu inteiramente ao seu amor adúltero por Guinevere, que excedia o seu amor a Deus, e, por uns tempos, decidiu renunciar a esse amor. No entanto, quando regressou a Camelot, a relação foi retomada e, deste modo, selado o fim inevitável do sonho arturiano.

Lancelot, depois de muito jejuar e rezar, chegou enfim a Carbonek, o Castelo do Graal. Poluído pelo pecado, não pôde entrar mas foi-lhe concedida uma visão do cálice. Tendo-se aproximado demasiado, foi acossado pelas chamas e caiu num torpor que durou 24 dias. (The Dream of Lancelot at the Chapel of The Holy Grail, E. Burne-Jones)

Por esse tempo, muitos dos cavaleiros mais velhos estavam mortos ou perdidos, e um novo contingente surgiu onde se destacou Mordred, filho ilegítimo de Artur, que começou a planear a destruição da Confraria. Surpreendendo Lancelot e Guinevere nos aposentos da rainha, logo que agora estes tinham decidido terminar a sua ligação para o bem do reino, Mordred forçou Artur a tomar uma posição e a condenar a sua rainha à fogueira. Lancelot salvou-a, mas matou acidentalmente Gareth e Gaheris, irmãos de Gawain, e Agravain.

Iniciou-se assim uma guerra no seio da Távola Redonda que culminou na morte de Gawain e na notícia de que Mordred, na ausência de Artur, que persegue Lancelot em França, se apoderou do trono. Artur regressou e defrontou o seu filho numa batalha final resultando daí a morte de ambos. Lancelot chegou tarde demais para ajudar o seu velho amigo.

Depois da guerra, visitou, pela última vez, Guinevere, agora no convento de Amesbury, abandonou as suas armas e adoptou a vida de um eremita. Assim viveu até ao fim dos seus dias. Guinevere morreu e foi sepultada junto de Artur, e, não muito tempo depois, morre também Lancelot sendo sepultado em Joyous Guard.

Assim termina a história do mais ilustre de todos os cavaleiros da Távola Redonda e, talvez, do mais trágico. Lancelot ficou dividido entre o amor e o dever e, na sua luta interior para manter ambos, pereceu arrastando com ele o reino de Artur. O seu fracasso na Demanda do Graal é uma das histórias mais dolorosas  de todo o ciclo. Tão grande era o seu coração que quase que alcançou o Cálice. No entanto, não era íntegro o suficiente e o seu fracasso tornou-se maior na medida em que quase era sucesso.

O seu amor por Guinevere prova ser superior ao seu amor por Deus, mas, à sua maneira, é um amor puro. Ao longo de todos os anos da sua devoção à rainha, Lancelot nunca olhou para outra (excepção feita a Elaine de Corbenic que o ludibriou). Quando urgia salvá-la de Meleagraunce, conduziu, quase sem hesitação, uma carroça - veículo reservado, naqueles tempos, para criminosos, mortos, ou transporte de adubo - mesmo assim, não se livrou da censura de Guinevere por ter hesitado, ainda que por breves momentos. Contudo, nesta e outras ocasiões em que a rainha põe em dúvida a sua lealdade, Lancelot permanece firme no seu amor.

Estas características tão humanas fazem de Lancelot uma das mais inesquecíveis personagens do ciclo arturiano, e de quem muito pode ser aprendido por aqueles que procuram entender a importância da sabedoria de Avalon.


Lancelot, "the ill-made knight", nos aposentos da rainha Guinevere. A sua relação amorosa destruiu o reino de Artur e impediu Lancelot de alcançar o Graal. (Lancelot and the Queen, de Dante Gabriel Rossetti)


Referência bibliográfica:

MATHEWS, John, The Arthurian Tradition, Element Books, Limited, 1994


Para um estudo mais detalhado ver aqui


Ride Si Sapis - Sir Launcelot


Monty Python and The Holy Grail - Sir Launcelot

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Travessia para Avalon: A Tradição Arturiana

Aventura, magia e romance constituem a matéria da tradição arturiana que vai buscar a sua força a diversas fontes. Dos mitos e lendas celtas derivam as histórias de Artur, de Avalon, de Merlim e das mulheres feéricas, guardiãs do Outro Mundo. Das canções de gesta medievais brotam as histórias dos cavaleiros da Távola Redonda: Lancelot, Galahad, Perceval, Gawain, e muitos outros, cujas aventuras encheram milhares de páginas de manuscritos relatando as suas jornadas pelas escuras e impenetráveis florestas do mundo arturiano. Do complexo código do Amor Cortês, surgiu uma nova atitude perante as mulheres que, ao invés de serem encaradas como mera mercadoria matrimonial, passaram a ser vistas como potenciais deusas (no contexto da convenção literária, entenda-se...). Exemplos destas heroínas são: Guinevere, Isolda, Elaine de Astolat, Elaine de Corbenic e muitas outras, também elas cortejadas, resgatadas e amadas pelos seus cavaleiros.

A quintessência da cavalaria - os cavaleiros de Artur partem na demanda de feitos heróicos, em nome da sua honra e para merecerem o amor das suas damas.(The Grail Quest Begins Tapestry, Edward Burne-Jones)

Subjacente a toda esta estrutura reside uma dimensão mais profunda, vinda de uma tradição mágica transmitida ao longo dos tempos e que floresceu na literatura medieval. O tema ancestral da interacção entre a dimensão humana e o Outro Mundo aparece constantemente no ciclo arturiano. Os segredos da imortalidade, da harmonia com a terra, do verdadeiro amor e da realização espiritual, são apenas algumas das dádivas destes heróis e heroínas. Estranhas e terríveis eram as suas aventuras, assim como estranhos e terríveis os seus adversários; magos e feiticeiras, damas encantadas, feras dotadas de inteligência humana, serpentes transformadas em belas mulheres se alguém fosse suficientemente ousado para as beijar, inimigos invisíveis, demónios, fantasmas e cavaleiros cuja armadura mudava de cor em segundos.

Frank Dicksee, Chivalry

Até a natureza se revelava irreal, com sangue a brotar de fontes, árvores com uma metade em chamas e a outra metade verde, terras estéreis tornadas férteis só com uma simples palavra...
Anéis mágicos, armas, cavalos, espadas retiradas de pedras, barcos que navegam por si próprios e figuras de xadrez movidas por mãos invisíveis, são só alguns dos elementos que compõem o mundo da tradição arturiana.
 
Não são simplesmente histórias. Nelas reside uma profundidade da experiência humana derivada de dimensões intemporais. Fazem parte da tradição Ocidental e, de um modo extrordinário e único, constituem o plano de fundo das nossas vivências quotidianas. Os mitos são intemporais e não se restringem a inclinações individuais. No entanto, são para todos:

The myths never have a single meaning, once and for all and finished. They have something greater; they have meaning itself. If you hang a crystal sphere in the window it will give off light from all parts of itself. That is how the myths are; they have a meaning for me, for you, and for everyone else. (Pamela Travers)

Ao meditarmos com as imagens e os acontecimentos das lendas arturianas, e analisarmos os seus arquétipos, podemos aprofundar a nossa consciência do seu potencial transformativo da nossa própria demanda pessoal...

Sir John Gilbert, Enchanted Forest, 1886

Referência bibliográfica:

MATHEWS, John, The Arthurian Tradition, Element Books, Limited, 1994

Ride Si Sapis: Estranha e Terrível Aventura


Monty Python - Knights Who Say Ni

domingo, 11 de julho de 2010

Travessia para Avalon: A descoberta do Tor

Seja de que ângulo for, o Tor emana poder e mistério. Há algo de invulgar e escultural na forma, com os socalcos espiralados que se parecem desenrolar em volta dos seus flancos, e a torre no cume faz lembrar um megálito do tamanho dos de Stonehenge. A torre é somente os despojos de uma Igreja de São Miguel que dominava antes o Tor. Um terramoto estranho fez desabar a igreja e deixou apenas a torre.

Em Inglaterra, locais antigamente consagrados à Deusa foram arrebanhados pelos cristãos de uma de duas maneiras: construindo-se igrejas dedicadas a São Miguel, como no Tor, ou capelas em louvor de Maria. Geralmente, representa-se São Miguel a pisar uma serpente, que era um símbolo da Deusa, e que também representava as correntes de energia telúrica ou "linhas de ligação" - assim chamadas em Inglaterra - que "serpenteiam" sob o solo em locais sagrados.

Na China, tais linhas designam-se por lung-mei, os caminhos do dragão: até hoje, na moderna Hong Kong, os geomantes são consultados acerca dessas correntes do dragão antes de se construir edifícios. As zonas onde a energia é mais forte tornam-se em locais sagrados, ou, por palavras correntes, pontos de poder.

As imagens associadas a essa energia são arquetipicamente semelhantes, esteja-se na Europa Ocidental ou na China. A cobra, o dragão chinês e a serpente têm todos corpos ondulantes e poder. Mas, enquanto nas culturas que respeitam a Terra, o dragão foi julgado benevolente, nas culturas judaico-cristãs onde a Terra (as deusas e as mulheres) tinha de ser subjugada, dragões, cobras e serpentes deviam temer-se - espezinhados por São Miguel, expulsos por São Patrício, ou mortos por São Jorge. (...)

O segundo processo de usurpar os locais da deusa era construir aí capelas, ou catedrais, em louvor de Maria. Como expressão feminina da divindade, Maria é arquetipicamente a Deusa-Mãe. (...) Porque, pondo de parte os pontos discriminatórios invocados pelos teólogos, o homem ou a mulher que reza a Maria está a falar com a mesma deusa compassiva cujo nome era, entre outros, Deméter, Ísis, Tara ou Kuan Yin, deusas essas que compreendiam, como Maria, o sofrimento. A filha de Deméter, Perséfone, foi raptada para o mundo inferior, e o filho de Ísis, Osíris, foi desmembrado, mas, tal como o Filho crucificado de Maria, tanto Perséfone como Osíris ressuscitaram. Quando se erigiram capelas a Maria, em antigos sítios de deusas, com efeito, estas foram re-consagradas e re-nomeadas: são locais onde se pode dizer que a Deusa continua a ser homenageada. (...)


Passeio no Tor
(...)
Ao ver-se o Tor de longe, a torre chama a atenção e parece ser o destino dos caminhos em espiral. No entanto, no Tor (...) tive várias impressões. A torre parecia, então, uma estrutura imposta, um artefacto que não pertencia ao todo. Em contrapartida, senti que aquele poder residia no próprio monte em forma de útero. Em vez de sentir um impulso para ir até ao cume, pareceu-me que devia haver um túnel, a partir de baixo, que penetrasse no monte.

Tais pensamentos, descobri depois, revelaram-se conjecturas antigas que outros tinham feito acerca do Tor: haveria um local oco ali dentro? Teria o Tor uma entrada para o mundo inferior? Geoffrey Ashe escreve: "Até hoje persiste uma lenda local afirmando que o Tor tem uma câmara no seu interior. Habitualmente diz-se que a câmara fica por baixo do cume, talvez a uma distância grande abaixo deste. Diz-se que houve pessoas que descobriam um caminho e saíam de lá loucas."

Na mitologia céltica, o mundo-além, o reino subterrâneo é Annwn, um reino de fadas. Tem-se associado esse reino com o Tor de Glastonbury. (...)

Túneis e subsolos ocos são imagens universalmente associadas à Terra-Mãe, como útero e túmulo, com a Deusa que nos dá vida e nos volta a possuir na morte. É certo que a Terra funciona como um caldeirão de regeneração: tudo morre e tudo vai para a terra ou para a atmosfera da terra, sendo reciclado e regenerado numa nova vida. A Terra-Mãe é igualmente o caldeirão da abundância, do qual vem tudo o que é necessário para alimentar a vida.

O Tor de Glastonbury, de forma uterina, suscita ideias acerca do mundo-além e de espaços ocultos debaixo do chão.

(...) De qualquer forma, o que é o Tor? Porque estejam nas profundezas da terra ou nas profundezas das psiques, na consciência, quer do visitante quer do nativo, vêm sobrenadar imagens relacionadas com o mundo-além e a Deusa.

Para mim, passar pelo Tor e acudirem-me impressões, que se revelaram como parte de lendas e conjecturas, ajusta-se ao que se tem dito sobre Glastonbury: é realmente um sítio onde o véu entre os mundos é mais fino. (...)
in Jean Shinoda Bolen, Travessia para Avalon, Planeta Editora





sexta-feira, 9 de julho de 2010

Camelot

Don't let it be forgot,
That once there was a spot,
For one brief, shining moment that was known as Camelot.

Camelot, Ilustração de Alan Lee, 1984

Camelot foi o castelo mais famoso das lendas medievais sobre o rei Artur e onde, de acordo com a lenda, ele reinou sobre a Bretanha antes da conquista saxã. Foi lá que Artur estabeleceu uma magnífica corte e juntou os melhores guerreiros da Europa, os Cavaleiros da Távola Redonda. Camelot foi o ponto de partida para a Demanda do Santo Graal, e, por volta do século XIII, tornou-se o símbolo central do mundo arturiano.

As histórias mais antigas de Artur não mencionam Camelot. É pela primeira vez explicitamente referido no romance Launcelot de Chretien de Troyes, no século XII. Ao longo dos tempos, muitos foram os sítios apontados para a localização de Camelot. Sir Thomas Malory, em Le Morte D'Arthur (século XV), situou-o em Winchester. Geoffrey de Monmouth, na sua History of the Kings of Britain (c. 1136), identificou-o como o Castelo Caerleon em Gales. Outros localizam-no perto de Tintagel, onde supostamente Artur nasceu.

De acordo com os romancistas, Camelot foi buscar o seu nome a um rei pagão chamado Camaalis. Mais recentemente, houve uma tentativa de localizar Camelot nas ruínas do Castelo de Cadbury, em Somerset, tendo o sítio sido escavado nos anos 60 do século XX. Algumas tradições suportam esta teoria: o Castelo de Cadbury é um forte da Idade do Ferro, que domina o Vale de Avalon, em direcção a Glastonbury. Perto ficam o rio Cam e "Queen Camel" (em tempos conhecida como Camel). No reinado de Henrique VIII, o antiquário John Leland fala da população local que se refere ao forte como "Camalat", o castelo de Artur.

A mitologia de Camelot e a história do rei Artur foi contada e recontada ao longo de séculos, e existem imensas versões. As lendas arturianas podem ter-se originado a partir de um Artur histórico, senhor da guerra do século VI, em Gales, mas as inúmeras versões da história removeram-no para bem longe desse tempo e desse espaço.

Devido à crença de que Artur regressará, ele é, por vezes, chamado "The Once and Future King" e Camelot acabou por não ser só visto como um local, mas como um estado de espírito, um reflexo de um ideal perdido. Tennyson, em The Idylls of the King, escreve que é um símbolo, "the gradual growth of human beliefs and institutions, and of the spiritual development of man."
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