Ainda há um século atrás se encontrava muita gente com bilhas cheias de água, vindo da fonte. Iam buscá-la para os arranjos da casa, para os animais. Muitas vezes iam mesmo de noite, quando havia menos pessoas à espera de encher a bilha.
Certa noite de lua cheia, as tias Bastos, da Ribeira Seca da Ribeira Grande, aproveitaram a calada da noite para irem à fonte. Enquanto esperavam que as talhas se enchessem, olhavam o majestoso mar que se estendia no seu azul negro lá ao longe.
De repente viram o mar abrir-se e fazer um longo caminho. Apareceu depois um homem jovem, muito belo, vestido como um rei e montado num cavalo branco. Veio-se aproximando, cavalgando, e ao chegar, perguntou com voz serena:
— Quem vive?
Repetiu a pergunta três vezes, mas as velhas, pasmadas e amedrontadas, puseram as bilhas à cabeça e fugiram sem responder Enquanto corriam para casa, olharam para trás e viram o rei caminhar para o mar de cabeça baixa, em passo vagaroso, fechando-se a estrada atrás dele.
No dia seguinte, as tias Bastos contaram aos vizinhos o que lhes tinha acontecido na noite anterior e ficaram a saber que aquele jovem era o rei D. Sebastião e que, quando o rei lhes perguntou “Quem vive?” deviam ter respondido “D. Sebastião mais a sua nação”. Teriam assim desencantado o rei e a ilha em que vive e que se chama D. Sebastião. Mas ao mesmo tempo que esta ilha se desencantasse, encantar-se-ia uma das ilhas dos Açores de nome feminino.
A ilha e o rei ainda continuam encantados e de sete em sete anos, numa noite de lua cheia, o infeliz rei vem a terra esperando que alguém o desencante.
FURTADO-BRUM, Ângela, Açores: Lendas e outras histórias, Ponta Delgada, Ribeiro & Caravana editores, 1999