terça-feira, 17 de agosto de 2010

O Santo Graal: Demanda do Absoluto

Galahad, filho de Lancelot e da Princesa do Graal , tem um só destino: encontrar o Castelo do Graal e trazer a cura ao reino do Rei Pescador.

O autor desconhecido da terceira parte do Ciclo da Vulgata, compreendendo a necessidade de um novo elemento que juntasse as diversas histórias num todo coerente, desenvolveu uma personagem, de índole cristã, que redimisse as lendas das suas origens pagãs. Assim surgiu Galahad: sem pecado, sem mácula, de coração puro.

In the Meanwhile came in a good old man, and an
ancient, clothed all in white, and there was no
knight knew from whence he came. And with him he
brought a young knight, both on foot, in red arms,
without sword or shield, save a scabbard hanging by
his side. And these words he said: 'Peace be with
you, fair lords'.
( Thomas Malory, Le Morte D' Arthur, XIII, Ch. 3)

Todos os lugares da Távola Redonda estão ocupados à excepção do Assento Perigoso, que, desde a fundação da Confraria, permanece vazio e encoberto. Ao ser agora descoberto, o nome de Galahad é revelado em letras de ouro. O jovem cavaleiro toma o seu lugar e os mistérios do Graal são desencadeados: os Cavaleiros da Távola Redonda iniciam a Demanda do Santo Graal.


Lancelot chegou ao Castelo do Graal num barco espectral sem comandante nem tripulação, tendo-lhe sido autorizada uma visão distante do Cálice Sagrado, como recompensa pela sua coragem. (Ilustração de Allan Lee, 1984)

Muitos hão-de falhar, incluindo o grandioso Lancelot. Mas Galahad é o seu filho, nascido em circunstâncias extraordinárias. O melhor cavaleiro de Artur e a Princesa do Graal conceberam o cavaleiro perfeito. Legitimamente, Galahad deveria ter sido o filho de Artur e Guinevere, rei e rainha, senhor e senhora. No entanto, Artur concebe Mordred com a sua meia-irmã Morgause e Lancelot é o amante de Guinevere. Desta teia de enganos surge a figura redentora de Galahad a quem é permitido alcançar o mistério do Graal - embora não seja bem sucedido na transformação final do reino num paraíso terreno. Contudo, é-lhe permitido olhar para o Graal e para o que contém fazendo-o expirar num extâse de desejo de união com o Absoluto.


A versão de Malory apresenta uma parada magnífica de personagens: as extraordinárias aventuras dos cavaleiros da Távola Redonda na senda do Santo Graal; os três cavaleiros vitoriosos (Galahad, Percival e Bors) a bordo do navio mágico de Salomão, navegando no tempo, para levar o Graal para Sarras, a Cidade Santa; o fracasso de Lancelot, Gawain e muitos outros; o triste destino da donzela Dindraine, irmã de Percival, que sacrifica s sua vida para salvar uma mulher enferma, e cujo corpo é também levado para Sarras a fim de ser sepultado junto ao de Galahad; o regresso de Percival  ao Castelo do Graal para o mistério continuar e para tornar possível a continuação da Demanda às gerações vindouras; o regresso de Bors à vida mundana trazando palavra dos grandes acontecimentos por si testemunhados.

Frank Dicksee, The End of the Quest

Para os que empreendem hoje a Demanda, fazem-no seguindo o trilho dos cavaleiros de Artur que pavimentaram o caminho e vislumbraram o significado do grande mistério. Neste sentido, eles são muito mais do que meras personagens num ciclo de lendas pois representam arquétipos, as diversas facetas da experiência humana, a aspiração, o fracasso e o derradeiro êxito. Das suas histórias emanam ensinamentos; sabedoria que, se estudada por aqueles que buscam o Graal, nos dias de hoje, poderá revelar o mistério por detrás da tradição arturiana...


Galahad recebe o alimento espiritual do Graal, seguido de Percival e Bors. ("How Sir Galahad, Sir Bors, and Sir Percival Were Fed with the Sanc Grael, but Sir Percival's Sister Died by the Way", de Dante Gabriel Rossetti, 1864)

O Santo Graal é um símbolo universal porque não exige aos que o buscam a pertença a um determinado culto ou credo - apenas que procurem o bem comum, a cura das terras estéreis. Servindo este ideal, somos servidos. Amadurecemos. O Graal envolve-nos na sua luz e uma mudança ocorre em nós. Ao permitirmo-nos fazer parte da sua acção de cura ou redenção, podemos nós próprios praticarmos a sua benção.

É este o grande segredo do Graal - que, afinal, não é segredo nenhum - outro paradoxo na sua natureza infinitamente paradoxal. Simultaneamente em todo e em nenhum lado; procurado por muitos mas encontrado por poucos; várias vezes removido, mas permanecendo sempre; pode curar e pode destruir; é Deus e ainda assim não é Deus. Da sua história não se vislumbra o início, o meio não é seguro e o fim não é certamente discernível.

Labirinto de Chartes

O Graal representa o enigma mais profundo da tradição arturiana. A sua Demanda não tem fim, é eterna. Oferece unidade no meio da fragmentação, unindo numa confraria todos os que caminham pelos trilhos do coração, na sua senda. É um portal entre os mundos e uma ponte para o Divino.
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