John Spencer-Stanhope, Morgan Le Fay
Nas lendas arturianas, Morgana, uma feiticeira, adquire um aspecto divino. Conhecida pelo epíteto "Le Fay", o seu nome deriva do francês "Morain le Feé"; em italiano , ela é "Fata Morgana". Representada como uma deusa das trevas, e apoiada nas poderosas forças do Inverno e da Guerra, ela é a antítese de Guinevere, cujo papel é o da "Noiva das Flores", símbolo da Primavera e do crescimento.
Discípula de Merlin, algumas versões dão conta da sua capacidade de voar e de se metamorfosear.Era a Senhora da Ilha de Avalon - ou a Ilha das Mulheres- , o domínio de uma irmandade de nove: Moronoe, Mazoe, Gliten, Glitonea, Cliton, Tyronoe e Thitis.
Como personagem literária, Morgana parece ter tomado forma no início do século XII, através dos menestréis da Bretanha e de Gales. No folclore bretão, ela é uma ninfa e nas lendas galesas,é Modron, a filha de Avallach. Outras histórias ligam-na à deusa irlandesa Macha ou a Morrighan, deusa guerreira.
Nas primeiras narrativas, portanto, Morgana é filha de Avallach, rei da Ilha Encantada, mais conhecida por Avalon. Ela é assim posta num contexto sobrenatural, derivado da mitologia pagã. Além de Avallach, um outro senhor da Ilha é referido por Chretien de Troyes que lhe dá o nome de Gingamor, apontando Morgana como sua amante.
Com o tempo, as duas figuras masculinas desapareceram das histórias e Morgana surge como Senhora de Avalon por direito próprio, filha de Gorlois, Duque da Cornualha, e Igraine.
Enviada para um convento para ser freira, aprendeu secretamente as artes mágicas. Para firmar uma aliança política, a sua mão é dada em casamento a Uriens de Gore e, assim, concebe Owain, um dos primeiros cavaleiros da Távola Redonda.
Morgana A Fada tinha uma natureza paradoxal, reflectida na sua dupla personalidade de curandeira e feiticeira negra, empreendendo a desgraça de Artur, mas também guardando-no na morte(Frederick Sandys, Morgan le Fay,1864)
Nas primeiras lendas, Morgana é essencialmente uma fada do Bem, auxiliando Artur na sua empresa. Aquando do seu nascimento, por exemplo, confere-lhe os dons da força, da vitória e de uma longa vida. Com o passar do tempo, o Cristianismo levou os romanceiros a tornarem a deusa mais humana e, simultaneamente, mais sinistra, devido às suas origens pagãs.
Um exemplo da sua maldade é quando lhe é atribuída a responsabilidade pela revelação da relação amorosa entre Guinevere e Lancelot. Numa versão, ela tenta seduzir, sem sucesso, Lancelot, havendo uma sugestão recorrente de que a sua malícia deve-se a uma paixão frustrada.
Morgana ajudou Artur a firmar o seu reino e agiu como uma guardiã da terra. A sua animosidade em relação a Artur funciona, nas narrativas, como um modo de testar o jovem rei.É o caso do Cavaleiro Verde, por ela enviado, para assustar a sua rival Guinevere e testar o cavaleiro Gawain, filho do rei Lot de Orkney, e o melhor cavaleiro da Távola Redonda até à chegada de Lancelot.Depois de matar o Cavaleiro Verde, Gawain torna-se no Cavaleiro da Deusa, o campeão de Morgana.
O nascimento de Modred também é atribuído às maquinações de Morgana, que faz com que Artur e a sua meia-irmão Morgause concebam um filho (noutras versões, mais tardias, Morgana é a mãe, e não a tia, de Modred). O propósito era assegurar a linha sucessória e manter viva e activa a aliança Soberana entre a terra e o rei. Modred, depois de se tornar cavaleiro, há-de ferir mortalmente Artur.
Morgana A Fada aparece nas narrativas ora como donzela, ora como anciã. Nestas histórias, o divino feminino adopta habitualmente disfarces tanto de uma jovem mulher como de uma velha.
Apesar de inimiga de Artur durante a sua vida, Morgana foi a sua protectora no Outro Mundo. Depois de ser ferido mortalmente por Modred, na batalha de Camlan, Artur é levado por Morgana para Avalon, para lá ser curado e esperar pela hora do regresso.
Morgana representa, nas lendas arturianas, um dos aspectos mais trágicos. Odiada por grande parte dos autores e académicos, e tratada como o bode expiatório de todo o mal que sobrevém ao reino de Camelot e como uma traidora (à semelhança de Judas), ela é uma heroína trágica. Os seus métodos podem ser questionados mas os seus objectivos não, assemelhando-se, por isso, à heroína grega Medeia. Morgana, em suma, aponta para as virtudes do auto-sacrifício e da perseverança nas convicções próprias, apesar das calúnias e perseguições.
Fora das narrativas arturianas, a personagem de Morgana também aparece no romance Ogier the Dane como Senhora de Avalon e em Orlando Furioso de Ariosto como a feiticeira Morgana, que vive num lago.
Morgana segura um ramo de macieira, o símbolo celta da paz e da abundância. Uma feiticeira inspirada, é geralmente representada como um espírito sombrio, contrariando Artur e manipulando heróis. A um nível mais profundo, é uma deusa do Inverno, da escuridão e da morte, oposta a Artur, o Senhor do Verão. Revela o aspecto redentor do seu carácter no papel de curandeira soberana de Avalon e guardiã do corpo de Artur na sua morte. (Ilustração de Stuart Littlejohn, 1994).
Referências bibliográficas:
COTTERELL, Arthur, Enciclopédia de Mitologia, Central Livros LDA, 1998
WOLF, Amber, Os Mistérios de Avalon, Planeta Editora, 1996
Para um estudo mais detalhado ver aqui
Ou aqui